Se a atenção tem preço, quem fica de fora do feed?

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Eduarda Camargo*

A decisão da Meta de repassar aos anunciantes brasileiros os 12,15% referentes a PIS/Cofins e ISS, a partir de janeiro de 2026, foi apresentada como um simples alinhamento ao padrão global de cobrança. Mas, sob olhar mais atento, trata-se de um movimento carregado de implicações estratégicas para o mercado digital. Afinal, quando o principal fornecedor de atenção online decide encarecer o acesso, não estamos apenas diante de uma mudança contábil: estamos assistindo à formação de um novo equilíbrio de poder entre empresas, plataformas e consumidores.

O primeiro impacto é evidente: campanhas mais caras reduzem a eficiência dos orçamentos, sobretudo para pequenos negócios. No modelo pós-pago, o gasto aumenta; no pré-pago, o mesmo valor compra menos mídia. Mas o efeito profundo vai além da matemática. Ao transferir o ônus para o anunciante, a Meta reforça uma assimetria estrutural: a dependência quase absoluta das marcas de seus canais, que concentram a atenção de bilhões de usuários. Se antes a plataforma funcionava como uma “porta de entrada” relativamente acessível, agora a visibilidade digital se torna um recurso escasso, seletivo e cada vez mais condicionado à capacidade financeira.

Essa mudança conversa diretamente com o momento econômico brasileiro. Em um cenário de margens apertadas e competição intensa, o aumento pode significar a diferença entre crescer e encolher. Startups em estágio inicial, empreendedores locais e até setores tradicionais que migraram para o digital durante a pandemia enfrentarão dilemas reais: reduzir alcance, repensar estratégia ou redirecionar parte do investimento para outros canais. A médio prazo, é possível que o marketing digital no país se reposicione, com menos pulverização e maior concentração em empresas capazes de sustentar gastos crescentes.

Há também uma questão de fundo: até que ponto o mercado brasileiro, tão dependente de Facebook e Instagram, pode se dar ao luxo de permanecer preso a um único ecossistema? O aumento imposto pela Meta pode ser lido como um convite à diversificação — de canais, de formatos e, sobretudo, de mentalidades. Estratégias orgânicas, construção de comunidade, marketing de influência e até a revalorização de mídias tradicionais podem ganhar força como alternativas mais equilibradas.

O risco, por outro lado, é o empobrecimento da pluralidade digital. Quando apenas grandes anunciantes conseguem competir por espaço, o ambiente tende à homogeneização: as mesmas marcas, os mesmos produtos, as mesmas narrativas, repetidas em looping nas timelines. O que se perde não é apenas diversidade de conteúdo, mas também oportunidades de inovação — já que muitas ideias disruptivas nascem justamente de pequenos agentes que hoje dependem das redes para se projetar.

No fim, o movimento da Meta nos obriga a repensar a lógica da economia da atenção. A cobrança de impostos é legítima, mas a decisão de transferir integralmente o custo escancara o quanto estamos reféns de plataformas que controlam não apenas a audiência, mas também as regras do jogo. Para os anunciantes, a saída não será simples: exige planejamento de longo prazo, ousadia para testar caminhos fora do óbvio e disposição para construir relacionamentos mais autênticos com seus públicos.

Se a atenção virou um ativo tão valioso quanto escasso, depender de um único fornecedor é mais arriscado do que nunca. Talvez o maior recado da Meta seja este: chegou a hora de tratar o marketing digital não como compra de alcance imediato, mas como construção de valor duradouro — algo que não se mede apenas em cliques, mas em confiança.

* Chief Growth Officer (CGO) da Portão 3 (P3)

“Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Jornal Hoje em Dia”.

Fonte: Hoje em Dia

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